Estima-se que um terço dos pacientes no mundo utilizam alguma prática integrativa e complementar no tratamento do câncer. Mapeamento sobre as evidências clínicas em Medicinas Tradicionais, Complementares e Integrativas (MTCI) revelam que as técnicas da Medicina Tradicional Chinesa, como acupuntura, práticas corporais e auriculoterapia, assim como a meditação, as plantas medicinais e a yoga, entre outros recursos, auxiliam no controle da própria condição patológica e de efeitos colaterais do tratamento, como dores, náuseas, vômito e fadiga. 

Redação: Katia Machado

Revisão: Ricardo Ghelman, Gelza Matos Nunes e Caio Portella.

O câncer é considerado, na atualidade, grave problema de saúde pública no mundo, figurando no rol das quatro principais causas de morte prematura (antes dos 70 anos de idade) na maioria dos países. A razão disso é que os novos casos da doença aumentam a cada ano, como mostram levantamentos feitos no Brasil e no mundo. Segundo o Instituto Nacional do Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca), órgão do Ministério da Saúde, estima-se uma média de 625 mil casos novos de câncer a cada ano do triênio 2020-2022(1). Seguindo a tendência mundial, a doença representa a segunda maior causa de morte no país, perdendo apenas para as doenças cardiovasculares. Segundo esta estimativa de novos casos ao ano, até 2022, o câncer de pele não melanoma será o mais incidente (177 mil), seguido pelos cânceres de mama (66 mil) e próstata (63 mil), cólon e reto (41 mil), pulmão (30 mil) e estômago (21 mil). 

Por sua vez, a Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC), instituição vinculada à Organização Mundial da Saúde (OMS), calculou, para o ano de 2018, que teríamos cerca de 18 milhões de casos novos e 9,6 milhões de mortes. Isso significa que uma em cada seis mortes, a nível global, estão relacionadas ao câncer. De acordo com a agência da OMS, o câncer de pulmão e o câncer de mama são os mais incidentes no mundo (2,1 milhões, cada), seguido pelo câncer de cólon e reto (1,8 milhão) e próstata (1,3 milhão). Os tipos de câncer mais frequentes nos homens, que representam 53% dos novos casos, são o câncer de pulmão (14,5%), próstata (13,5%), cólon e reto (10,9%), estômago (7,2%) e fígado (6,3%). Nas mulheres, que representam 47%, as maiores incidências são de mama (24,2%), cólon e reto (9,5%), pulmão (8,4%) e colo do útero (6,6%).

Isso se deve, em parte, por conta do envelhecimento populacional, mas também face à mudança na distribuição e na prevalência dos fatores de risco da doença, associados a hábitos e estilo de vida inerentes ao desenvolvimento socioeconômico urbanizado, dos quais fazem parte o sedentarismo, a alimentação inadequada, o alto nível de estresse, entre outros.  O Inca calcula que os fatores de risco listados representam 80% a 90% das causas do câncer, já os fatores genéticos são, no máximo, 20% das causas da doença(2).

Dispêndios do câncer

Consequentemente, os custos com o tratamento do câncer são volumosos. Em 2017, o desembolso total do câncer no Brasil foi de R$ 68,2 bilhões, de acordo com o estudo ‘Câncer do Brasil: a jornada do paciente no sistema de saúde e seus impactos sociais e financeiros’(3), realizado pela Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma) e pela IQVIA, com apoio da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica e do Instituto Oncoguia. A pesquisa listou os gastos diretos com a doença, como medicamentos, hospitalizações e cirurgias, somando o gasto do SUS (R$ 4,5 bilhões) com a saúde suplementar (R$ 14,5 bilhões): total de R$ 18,9 bilhões. Já os custos indiretos, incluindo morte prematura, absenteísmo, benefícios por incapacidade, auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, somaram valores bem superiores, na ordem de R$ 49,2 bilhões, o que representou 72% dos custos totais do câncer no país em 2017. 

No artigo ‘O custo do tratamento do câncer no Brasil’(4), o economista do Banco Mundial, André Medici, revela que, entre 1999 e 2015, os gastos no Brasil somente com tratamento do câncer, excluindo ações de promoção da saúde e prevenção da doença, aumentaram de R$ 470 milhões para R$ 3,3 bilhões, representando um crescimento de sete vezes no período de 16 anos, e cerca de 2/3 desses gastos foram destinados à quimioterapia. Segundo o especialista, estudos realizados, em 2016, pela Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale) sobre custos no SUS, conforme o estágio da doença, revelou que o câncer de mama, por exemplo, quando diagnosticado no estágio inicial custou um valor, que foi triplicado quando a doença foi diagnosticada no estágio intermediário e, o mesmo, no estágio mais avançado, foi multiplicado seis vezes.

“Estes dados reforçam a importância de diagnosticar a doença em estágio inicial e das ações de prevenção de fatores de riscos da doença, incluindo uma alimentação saudável, rica em vegetais do tipo mediterrâneo e asiático, por exemplo, atividades físicas moderadas associadas à redução do stress e boa resiliência”

Orienta o médico oncopediatra, presidente e membro do Comitê de Oncologia Integrativa do Consórcio Acadêmico Brasileiro de Saúde Integrativa (CABSIN), Ricardo Ghelman. 

Oncologia Integrativa: do que estamos falando?

Reconhecida por sua abordagem personalizada, centrada no paciente e baseada em evidências, ao lado do tratamento oncológico convencional, a oncologia integrativa (integrative oncology) – termo cunhado, em 2000, pelo médico Robert Wittes, diretor da unidade de tratamento e diagnóstico do câncer do National Cancer Institute (NCI) – entende que o câncer envolve mais do que o controle da doença. Ela inclui diferentes cuidados, por vezes não abordados pela medicina convencional, como boca seca, ondas de calor, alteração de memória e neuropatia(5). Segundo a definição da médica e pesquisadora Claudia Witt e colaboradores(6), a Oncologia Integrativa é um campo de cuidado centrado no paciente, que utiliza práticas corporais e mentais, produtos naturais e/ou modificações no estilo de vida a partir de diferentes tradições, juntamente com tratamentos convencionais de câncer. “Este campo visa otimizar a saúde, a qualidade de vida e os resultados clínicos em toda a trajetória de cuidados com o câncer e capacitar as pessoas para prevenir o câncer e se tornarem participantes ativos antes, durante e além do tratamento do câncer”, escreve. 

A oncologia é a especialidade na área da saúde com maior representatividade dentro das Medicinas Tradicionais, Complementares e Integrativas (MTCI) no mundo, possuindo, inclusive, uma sociedade internacional, a Sociedade de Oncologia Integrativa (SIO), destaca Ghelman. Segundo ele, o National Center for Complementary and Integrative Health (NCCIH) e o NCI, vinculado ao National Institute of Health (NIH), nos EUA, estimam que cerca de 30% da população oncológica utilize de forma complementar alguma abordagem integrativa, e este número varia de país a país.

O pesquisador e oncologista clínico Jun Mao, atual presidente da Society of Integrative Oncology (SIO) e diretor do setor de Medicina Integrativa do Sloan Memorial Hospital em New York, explica que a oncologia integrativa focaliza o controle de sintomas, como dor, fadiga e ansiedade, provocadas pelo tratamento da doença, beneficiando muito a qualidade de vida dos pacientes oncológicos. Mao e Latte-Naor afirmam que a acupuntura, o tai chi e a meditação, por exemplo, apresentam redução durável e significativa da insônia e do estresse. Já as práticas corporais, como o tai chi e a yoga, previnem quedas ou lesões e constroem uma forma segura e agradável de exercício físico aos sobreviventes de câncer, promovendo autoestima e qualidade de vida(7). Vale citar que o Sloan Memorial Hospital e o MD Anderson Câncer Center, dois importantes hospitais de oncologia nos EUA, em busca de respostas mais exitosas e em vista de um cuidado integral, destinaram uma ala exclusiva à oncologia integrativa. 

Outras renomadas associações americanas, como a The Joint Commission, a American College of Physicians, a National Comprehensive Cancer Network e a American Society of Clinical Oncology, também recomendam a combinação de modalidades farmacológicas e não farmacológicas no tratamento do câncer, uma vez que ajudam a reduzir o impacto de problemas angustiantes, como ansiedade, medo, fobia, raiva, ressentimento, depressão e dor e, ao mesmo tempo, promovem um bem-estar físico, emocional e espiritual.

As Medicinas Tradicionais, Complementares e Integrativas – ou Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS), como as MTCI são denominadas no Brasil – são também amplamente utilizadas na maioria dos países da América Latina. O Brasil, como referência mundial em MTCI, especialmente na atenção primária à saúde do SUS, permite o acesso a 29 práticas integrativas e complementares, através da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PNPIC), em mais de três quartos dos municípios do país. No entanto, frente à natureza do câncer, que exige cuidados de alta complexidade, a oncologia integrativa tem sido adotada especialmente em hospitais. 

Ghelman conta que várias instituições hospitalares de referências vêm incorporando novas modalidades para o tratamento do câncer, segundo o conceito de oncologia integrativa. Entre elas, destacam-se: o Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, pioneiro desta proposta desde 2007, em parceria com o Hospital MD Anderson, nos EUA; o Hospital Alemão Oswaldo Cruz, junto ao Serviço de Cuidados Paliativos; o Hospital Sírio Libanês, com rica discussão da temática em reuniões científicas regulares; o Inca, que incorporou a meditação de atenção plena (mindfulness) de forma programática e, ainda, de forma multimodal na oncologia pediátrica; o Instituto de Tratamento do Câncer Infantil (ITACI), de forma multimodal, em parceria com o Hospital Charité, em Berlim; e o Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP), com ênfase em acupuntura – os dois últimos, vinculados ao Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP). “Com o avanço nas terapias modernas de imunoterapia e terapia alvo, alcançando ótimos índices de sobrevida em alguns tipos de câncer, o desafio mudou da questão da sobrevivência para uma questão de qualidade de vida multidimensional em uma condição crônica associada a uma série de comorbidades e sequelas”, informa o oncopediatra.  

Deste cenário, fazem também parte o Hospital da Faculdade do ABC, em São Paulo, no desenvolvimento da pesquisa clínica com plantas medicinais brasileiras, e o hospital da Universidade Federal do Ceará, que, em parceria com o Instituto Roda da Vida, trabalha no atendimento e com ensino e pesquisa em oncologia integrativa. O CABSIN, por sua vez, em parceria com o Inca, reúne através do Comitê de Oncologia Integrativa, coordenado pela oncologista Paola Torres, professora titular do Departamento de Medicina Clínica da Universidade Federal do Ceará, representantes do movimento da oncologia brasileira que vêm incorporando esta modalidade integrativa, entre eles o Inca, a USP, a Unicamp, a Faculdade de Medicina do ABC, o Centro Paulista de Oncologia/Oncoclínicas, a Américas Centro de Oncologia Integrado e a Isionco Oncología Integrativa. ”As PICS, na oncologia, são mais fortes no cenário internacional do que nacional, principalmente quando falamos de hospitais. Mas esta é uma área promissora, em desenvolvimento no país”, afirma Ghelman.

A prevalência do uso das MTCI/PICS em pacientes com câncer da América Latina é particularmente alta, variando entre 50% e 90% dos adultos e das crianças, seja para tratar a doença em si, controlar os sintomas ou moderar os eventos adversos da terapia antineoplásica. As práticas mais frequentes na região, de acordo com o presidente do CABSIN, são de base religiosa (xamanismo), fitoterapia e suplementos nutricionais. No Brasil, destacam-se ainda a meditação, a yoga, a musicoterapia, o toque terapêutico, a auriculoterapia, a acupuntura, os fitoterápicos e a terapia de dança. Na Argentina, acrescenta, o Garrahan Pediatric Hospital e o Fundaleu são dois exemplos notáveis de centros de saúde que, com recomendação médica, aplicam as práticas das MTCI no âmbito clínico, tais como terapias mente-corpo (imagens guiadas, massagem, atenção, yoga, tai chi e musicoterapia), reiki, mandalas e terapia hortícola. 

Benefícios das PICS para o Câncer

Publicação da revista de maior impacto da literatura médica no globo, The Cancer Journal for Clinicians, publicação da American Society of Clinical Oncology (ASCO), que define as diretrizes do tratamento oncológico em todo mundo, orienta ser imperativo que os prestadores de cuidados oncológicos ajudem os pacientes a tomar decisões informadas por evidência sobre o uso da medicina complementar e integrativa(8). Os pesquisadores do estudo informam que, nos EUA, oito em cada dez sobreviventes do câncer usaram, em 2012, as práticas integrativas e complementares.

Na mesma direção, a Society for Integrative Oncology (SIO), endossada pela American Society of Clinical Oncology (ASCO), publicou as diretrizes de prática clínica atualizadas para o uso de práticas integrativas e complementares em saúde (PICS), com base em evidências, durante e após o tratamento do câncer de mama, incluindo ansiedade, estresse, depressão, transtornos do humor, fadiga, qualidade de vida, funcionamento físico, náuseas e vômitos, linfodema, neuropatia periférica, dor e distúrbios do sono. 

Mapeamento das Evidências Clínicas em MTCI, projeto orientado pelo CABSIN e o Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde da Organização Pan-Americana da Saúde (Bireme/Opas/OMS), com apoio da Coordenação Nacional das Práticas Integrativas e Complementares de Saúde do Ministério da Saúde, destaca 57 revisões sistemáticas sobre o câncer e as MTCI. Quanto aos desfechos clínicos, foram encontrados, em quantidade decrescente de estudos de revisão sistemática, as seguintes áreas: câncer de mama, toxicidade da quimioterapia, dor, fadiga, náuseas e vômitos, leucopenia induzida pela quimioterapia, menopausa induzida pela hormonioterapia, artralgia induzida por inibidores de aromatase, anemia e plaquetopenia e síndrome mão-pé induzidos pela quimioterapia. Quanto às intervenções, destacam-se a acupuntura, com treze revisões, a prática corporal chinesa, com onze, meditação e plantas medicinais, com sete cada um, a shantala, com seis, e a yoga, com três revisões sistemáticas. “Este conjunto de estudos vem sendo sistematizado para construção de diretrizes baseadas em revisões sistemáticas”, anuncia Ghelman.  

As MTCI, segundo estudo publicado no The Cancer Journal, por pesquisadores da Universidade de Michigan, nos EUA, mostram-se também favoráveis no combate à fadiga relacionada ao câncer. Este é um dos sintomas mais comuns que afetam os sobreviventes do câncer, chegando a ocorrer em até 90% dos pacientes durante o tratamento ativo e 82% após o tratamento. O problema está relacionado a vários processos biológicos, como resposta imunológica, inflamação, disfunção metabólica, neuroendócrina e do sistema nervoso central, e pode interferir de forma negativa nas atividades da vida diária(9). Segundo os autores, a hipnose e o fitoterápico ginseng americano se mostraram eficientes durante o tratamento oncológico, enquanto a acupressão, a meditação, a qigong e o tai chi foram eficazes no pós-tratamento. 

No Brasil, algumas plantas da região amazônica, como Uncaria tomentosa (Unha-de-gato) e Paullinia cupana (Guaraná), são destacadas em ensaios clínicos conduzidos pela equipe do professor Auro Del Giglio, da Faculdade do ABC em São Paulo, pois mostram um perfil de atividade interessante antifadiga e no controle da perda de peso antes e durante o tratamento antineoplásico(10)

PICS, Dores e Saúde Mental em Pessoas com Câncer

Conforme levantamento científico realizado em 2019, a dor é um dos mais comuns e temidos sintomas relacionados ao câncer: 55% dos pacientes sentem dor durante o tratamento do câncer e 40% sentem dor depois do tratamento curativo do câncer(11). Pacientes com câncer podem sentir dor provocada pela doença em si, como também pelos efeitos adversos do tratamento, como as dores músculo esqueléticas, induzidas por quimioterapia, dores pós-operatórias nas feridas, dores advindas da mucosite induzida por radiação, dermatite ou enterite, dentre outras, podendo ainda tornar-se crônica para muitos sobreviventes do câncer, como uma sequela de longo prazo. Pesquisa sobre os recursos integrativos e complementares para a dor do câncer(12), publicada em 2014, em renomada revista científica, confirma que a acupuntura, bem como as intervenções psicoeducacionais e musicais, as terapias com artes criativas, a reflexologia, o qigong, o Reiki, bem como o uso de licopeno (antioxidante capaz de proteger as células do nosso organismo contra os efeitos nocivos do excesso de radicais livres, reduzindo assim o risco de doenças crônicas), a injeção de composto kushen (medicamento de patente chinês, aprovado pela China Food and Drug Administration) e a homeopatia, quando associadas às terapias convencionais do câncer, trazem efeitos benéficos à dor provocada pela doença. 

Já a meditação e a musicoterapia são recomendadas para o gerenciamento de estresse. A yoga é indicada para redução da ansiedade e do estresse. A meditação, o relaxamento, a yoga, a massagem e a musicoterapia, para depressão e transtornos do humor. A meditação e a yoga, para melhorar a qualidade de vida. E a acupressão e a acupuntura, para redução de náuseas e vômitos induzidos por quimioterapia(13).

Os benefícios da meditação de atenção plena (mindfulness) para saúde mental e redução do estresse de pacientes com câncer são demonstrados em estudo publicado em 2009, no periódico Psycho-Oncology(14). O trabalho científico verifica que a meditação de atenção plena pode melhorar o ajustamento psicossocial de pacientes com câncer a sua doença. Publicado em 2011, no periódico científico Forsch Komplementmed, o estudo da redução do estresse baseado em mindfulness para tratamento integrado do câncer(15) fornece uma visão abrangente das evidências existentes relevantes e avalia criticamente o uso da prática no tratamento do câncer. A pesquisa confirma que a técnica de mindfulness pode melhorar a qualidade de vida e o humor e reduzir o sofrimento em pacientes com câncer.

A angústia, geralmente considerada uma experiência psicológica, social ou espiritual negativa, é outro fator relacionado ao câncer, porque pode prejudicar a capacidade de enfrentar o diagnóstico e o tratamento. Esta sensação está relacionada aos sintomas da fadiga, da insônia e da dor, comuns entre sobreviventes do câncer. Afinal, a rotina de vida do paciente oncológico, que inclui conhecer novos medicamentos, dar conta de agendamentos de consultas médicas diferentes, informar a família e amigos sobre o diagnóstico e planos de tratamento e prognóstico, gera sofrimento da angústia. Por isso, a angústia já está sendo considerada como “sexto sinal vital” no tratamento do câncer e requisito de acreditação para centros de câncer no Canadá e nos Estados Unidos. Deste contexto, fazem parte a National Comprehensive Cancer Network (NCCN) e a Canadian Association of Psychosocial Oncology (CAPO). Os centros de pesquisa sobre o câncer recomendam a meditação e a musicoterapia para o gerenciamento do estresse, além da yoga, da acupuntura e da massagem para a redução da ansiedade. 

Uma pesquisa sobre os benefícios clínicos da acupuntura para a redução dos efeitos colaterais associados a terapia hormonal em pacientes com câncer de mama(16),publicada na revista científica Integrative Cancer Therapies, em 2018, mostra que a prática da acupuntura ajudou a reduzir a frequência, os sintomas e os efeitos colaterais relacionados à terapia hormonal, como a dor nas mamas (mastalgia), as náuseas e a cefaleia. Ainda em relação à acupuntura, estudo publicado no European Journal Cancer Care(17), em 2017, revela que a prática mostrou-se especialmente eficaz no alívio da dor relacionada ao câncer, particularmente da dor relacionada com a malignidade e induzida por cirurgia. Os resultados da pesquisa sugerem que a acupuntura pode ser adotada como parte de uma abordagem multimodal para reduzir a dor relacionada à doença.

Os achados, de acordo com Ghelman, foram corroborados pelo grupo brasileiro de acupuntura do Instituto do Câncer de São Paulo (Icesp), hospital de referência do estado de São Paulo, vinculado ao Complexo do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, que verificou em estudo publicado, em 2018, por D’Alessandro e colaboradores uma redução significativa em 63,6% dos casos de pacientes com sintomas como dor, quimiotoxicidade, dor lombar e dor perioperatória. 

Publicado na Revista Latino-Americana de Enfermagem, em 2017, um estudo sobre os efeitos da aplicação da massagem terapêutica em crianças com câncer(18), por sua vez, identifica que as práticas integrativas, quando usadas em crianças recebendo quimioterapia e outros tratamentos, auxilia a diminuir os efeitos colaterais, como dor, náusea, vômito, estresse pós-traumático, depressão e ansiedade. A pesquisa, que tomou como base uma revisão sistemática de ensaios clínicos controlados, analisou os efeitos da massagem nas diferentes fases e tipos de câncer infantil (entre 1 e 18 anos).

São muitos os avanços, bem como são expressivos os desafios para a implementação da oncologia integrativa, observa Ghelman. Ele realça a escassez de pesquisas de serviços oncológicos brasileiros, que avaliem os resultados clínicos de modalidades terapêuticas complementares, a carência de programas de treinamento para profissionais de saúde e de financiamento de pesquisa para terapias farmacológicas complementares, com estudos de interação medicamentosa, assim como a falta de estudos com terapias complementares não-farmacológicas e de modelos multimodais, incluindo sistemas médicos complexos, avaliando segurança e custo-benefício. “Por outro lado, temos a oportunidade de desenvolver um programa de colaboração internacional, com estudos multicêntricos, com novas modalidades terapêuticas promissoras e novos modelos de cuidados baseados em boas práticas clínicas no país e programas internacionais de treinamento de alto nível”, acrescenta, sugerindo um caminho pela frente que integra integrando esforços do Comitê de Oncologia Integrativa do CABSIN, da Rede MTCI Américas, do Inca, do Society of Integrative Oncology, da Opas e das agências de fomento à pesquisa.

 Referências 

  1. Incidência de Câncer no Brasil, estimativa para 2020-2022.
  2. Brasil. Instituto Nacional do Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA), Ministério da Saúde.
  3. Câncer no Brasil: a jornada do paciente no sistema de saúde e seus impactos sociais e financeiros.
  4. O custo do tratamento do câncer no Brasil.
  5. Lopez, G., Lacey, J., Christie, A. J., Powers-James, C., Narayanan, S., Liu, W., & Cohen, L. (2019). Patient-reported outcomes in integrative oncology: bridging clinical care with research. The Cancer Journal, 25(5), 311-315.
  6. Claudia M. Witt et al. A Comprehensive Definition for Integrative Oncology – JNCI Monographs, Volume 2017, Issue 52, 1 November 2017. 
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  9. Arring, N. M., Barton, D. L., Brooks, T., & Zick, S. M. (2019). Integrative Therapies for Cancer-Related Fatigue. The Cancer Journal, 25(5), 349-356.
  10. Guaraná e unha-de-gato podem reduzir fadiga de pacientes com câncer | Radioagência Nacional (ebc.com.br)
  11. Deng, G. (2019). Integrative Medicine Therapies for Pain Management in Cancer Patients. The Cancer Journal, 25(5), 343-348.
  12. Yanju Bao, Xiangying Kong, Liping Yang, Rui Liu, Zhan Shi, Weidong Li, Baojin Hua, Wei Hou. Complementary and Alternative Medicine for Cancer Pain: An Overview of Systematic Reviews, Evidence-Based Complementary and Alternative Medicine, vol. 2014, Article ID 170396, 9 pages, 2014. 
  13. Lyman, G. H., Greenlee, H., Bohlke, K., Bao, T., DeMichele, A. M., Deng, G. E., … & Mussallem, D. M. (2018). Integrative therapies during and after breast cancer treatment: ASCO endorsement of the SIO clinical practice guideline. Journal of Clinical Oncology, 36(25), 2647-2655.
  14. Ledesma D, Kumano H. Mindfulness-based stress reduction and cancer: a meta-analysis. Psychooncology. 2009 Jun;18(6):571-9. doi: 10.1002/pon.1400. PMID: 19023879.
  15. Musial F, Büssing A, Heusser P, Choi KE, Ostermann T. Mindfulness-based stress reduction for integrative cancer care: a summary of evidence. Forsch Komplementmed. 2011;18(4):192-202. doi: 10.1159/000330714. Epub 2011 Aug8. PMID: 21934319.
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