Artigo Comentado – Aromaterapia: Effects of Silexan on the Serotonin-1A Receptor

Comentado por: Profa Dra Adriana Nunes Wolffenbüttel – Dra. em Ciências Farmacêuticas, especialista em aromaterapia, Membro do Comitê de Produtos Naturais/CABSIN

            Inicialmente a aromaterapia foi considerada a terapia através do aroma. O termo foi cunhado por René-Maurice Gattefossé, na edição de seu livro, Aromathérapie: les huiles essentielles hormones végétales, em 1937, já tendo sido utilizado em seus artigos desde 1935. É uma prática terapêutica que utiliza óleos essenciais – 100% naturais, puros e completos – com suas propriedades específicas, de origem botânica conhecida e composição química completa, de acordo com o método de extração para sua produção.  Devido a característica de volatilidade, atribuiu-se na época a função terapêutica ao aroma. Atualmente agrega-se outras formas de aplicação desta terapia, mantendo a via inalatória, soma-se o uso tópico, supositório, óvulo e oral.

            O artigo em questão foi eleito para ser comentado, visando apresentar aos leigos na aromaterapia, que esta não é “apenas um cheirinho“. Este artigo demonstra a complexidade das pesquisas atuais. Trata-se do estudo do mecanismo de atuação ansiolítica do medicamento Silexan, 80 mg de óleo essencial (OE) de lavanda Lavandula angustifolia, patenteado na Alemanha em 2010 sob o nome LaseaÒ. O lançamento ocorreu após o cumprimento das exigências de eficácia e toxicidade. Nas inúmeras publicações atuais no  PUBMED e no PMC-NIH, observa-se que não há questionamentos sobre a atuação nas patologias psico-psiquiátricas: ansiedade generalizada e depressão leve. Busca-se descobrir o mecanismo de ação, uma vez que já se tem o conhecimento que a lavanda não atua nos mesmos centros dos medicamentos alopáticos para ansiedade e depressão, não causando seus efeitos colaterais, dentre eles a dependência.

Acesso ao Artigo: Baldinger, P., Höflich, A. S., Mitterhauser, M., Hahn, A., Rami-Mark, C., Spies, M.,  Kasper, S. (2015). Effects of Silexan on the serotonin-1A receptor and microstructure of the human brain: a randomized, placebo-controlled, double-blind, cross-over study with molecular and structural neuroimaging. International Journal of Neuropsychopharmacology, 18(4).

Objetivo

Investigar os aspectos neurobiológicos dos efeitos ansiolíticos do Silexan.

Hipótese

A administração do Silexan pode ter um impacto significativo tanto no neurotransmissor recaptador de serotonina (5-HT1A) com no volume de matéria cinzenta, ambos em nível do sistema nervoso central (SNC) no cérebro. Espera-se uma redução do receptor 5-HT1A após administração prolongada do Silexan em comparação com placebo análogo, ao modo de ação descrita para o escitalopram.

Equipamentos de avaliação

Tomografia por Emissão de Pósitron (PET), juntamente com Ressonância Magnética (RM)*.

Metodologia:

  • Voluntários: 25 indivíduos saudáveis ​​
  • Idade: 20 e 34 anos de idade
  • Avaliação 1, saúde mental: cada participante foi avaliado como mentalmente saudável, por psiquiatra experiente usando a Entrevista Clínica Estruturada para transtornos do eixo I do DSM-IV.
  • Avaliação 2, saúde física: cada participante foi submetido a exame médico, incluindo físico geral e neurológico status, medições laboratoriais de rotina, tiras de teste de urina, eletrocardiograma. Não consumidores de drogas psicoativas e nunca ter estado em psicoterapia.
  • Critérios de exclusão: Qualquer transtorno psiquiátrico, incluindo abuso de drogas, doença neurológica, alergias graves ou histórico de tais. Consumo diário regular de mais do que a quantidade equivalente de aproximadamente 20 g de álcool ou mais de 10 cigarros foram excluídos do estudo.
  • Ensaio: monocêntrico, ensaio duplo-cego, randomizado, controlado por placebo, cruzado. Assinaram o Termo de consentimento livre e esclarecido da Universidade Médica de Viena (Áustria), Departamento de Psiquiatria e Psicoterapia. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Faculdade de Medicina de Viena e o Hospital Geral de Viena (Áustria).

Protocolo do ensaio

Figura 1:

  • Fase I: grupo experimental (ingestão diária de 2 cápsulas, o que equivale a 160 mg OE de lavanda, após o café da manhã, durante 8 semanas consecutivas); grupo placebo (dose diária de 2 cápsulas, com placebo, após o café da manhã, durante 8 semanas consecutivas);
  • Ao final da Fase I, Medições I: Tomografia por Emissão de Pósitron  (PET), juntamente com Ressonância Magnética (RM)
  • Intervalo: 2 semanas
  • Fase II: grupo experimental (ingestão diária de 2 cápsulas, o que equivale a 160 mg OE de lavanda, após o café da manhã, durante 8 semanas consecutivas); grupo placebo (dose diária de 2 cápsulas, com placebo, após o café da manhã, durante 8 semanas consecutivas);
  • Ao final da Fase II, Medições II: Tomografia por Emissão de Pósitron  (PET), juntamente com Ressonância Magnética (RM)

Resultados:

Figura 2.

 

Average serotonin-1A receptor (5-HT1A) binding potential of 17 healthy men after chronic administration of (a) placebo and (b) Silexan. Positron emission tomography (PET) data are superimposed on a sagittal and axial view of a structural magnetic resonance imaging (MRI) template. The color table indicates the 5-HT1A receptor binding potential. A reduced 5-HT1A receptor binding after the intake of Silexan can be observed in several brain regions.

Legenda: Potencial médio de ligação do receptor de serotonina-1A (5-HT1A) de 17 voluntários após a administração crônica de (a) placebo e (b) Silexan. Tomografia por Emissão de Pósitron  (PET) são sobrepostos em uma vista sagital e axial de um modelo de imagem de Ressonância Magnética (RM). A tabela de cores indica o potencial de ligação ao receptor 5-HT1A. Uma ligação reduzida ao receptor 5-HT1A após a ingestão de Silexan pode ser observada em várias regiões do cérebro.

Figura 3.

 

(a) Differences in serotonin-1A receptor (5-HT1A) binding potential following the administration of Silexan vs placebo for a minimum of 8 weeks, presented on a sagittal and axial view, superimposed on a structural magnetic resonance imaging (MRI) template. Shown are t values of the analysis of variance (ANOVA) (voxel level: P<.005 uncorrected for multiple comparisons; cluster level: P<.05, family-wise error rate [FWE] corrected) displaying significant diffe rences in 2 interconnected clusters (encompassing the inferior temporal gyrus, fusiform gyrus, lingual gyrus, precuneus, and left hippocampus on the one hand and the right insula, orbitofrontal gyrus, and anterior cingulate cortex on the other hand). Peak t values can be observed in the insula, fusiform gyrus, and anterior cingulate cortex. The color table indicates the t values. (b) Scatter plots displaying regional differences of 5-HT1A receptor binding after the intake of Si lexan vs placebo in the anterior cingulate cortex and inferior temporal lobe. In both regions, a significant reduction of 5-HT1A receptor binding potential after the intake of Silexan as compared with placebo can be observed (P<.05 FWE-corrected cluster level). Ant cing cortex, anterior cingulate cortex; Inf temp cortex, inferior temporal cortex.

Legenda: (a) Diferenças no potencial de ligação do receptor de serotonina-1A (5-HT1A) após a administração de Silexan vs placebo por um mínimo de 8 semanas, apresentado em uma vista sagital e axial, sobreposto em um modelo de imagem por ressonância magnética (RM). São mostrados os valores t da análise de variância (ANOVA) (nível de voxel: P <0,005 não corrigido para comparações múltiplas; cluster nível: P <0,05) exibindo significativo diferenças em 2 clusters interconectados (abrangendo o giro, giro fusiforme, giro lingual, precuneus e hipocampo esquerdo e a ínsula direita, giro orbitofrontal e córtex cingulado anterior). Os valores de pico t podem ser observados na ínsula, giro fusiforme, e córtex cingulado anterior. A tabela de cores indica os valores t. (b) Gráficos de dispersão exibindo diferenças regionais de ligação ao receptor 5-HT1A, após a ingestão de Silexan vs placebo no córtex cingulado anterior e lobo temporal inferior. Em ambas as regiões, uma redução significativa do potencial de ligação ao receptor 5-HT1A, após a ingestão de Silexan em comparação com placebo pode ser observado (P <0,05).

Tabela 1.

Medidas repetidas comparando a ligação do receptor 5-HT1A, após a ingestão de Silexan versus placebo, sob a ferramenta de estatística ANOVA.

Tabela 2.

Medidas repetidas comparando o volume da matéria cinzenta após a ingestão de Silexan versus placebo, sob a ferramenta de estatística ANOVA.

Conclusões finais:

Este é o primeiro estudo a investigar os efeitos do Silexan usando técnicas modernas de imagem de neuroreceptores in vivo. Resumindo, esta investigação através de tomografia por emissão de pósitron (PET) mostra uma redução da ligação ao receptor 5-HT1A (receptor de serotonina) em indivíduos saudáveis após a administração diária de 160 mg de Silexan por um mínimo de 8 semanas em comparação ao placebo. Este dado está de acordo com a redução da ligação ao receptor 5-HT1A, quando induzida por medicamentos alopáticos inibidores seletivos da recaptação da serotonina, e pode ser o mecanismo na ação terapêutica de tratamento ansiolítico ou antidepressivo. A falta de mudanças volumétricas nas estruturas da matéria cinzenta, conforme demonstrado com ressonância magnética (RM), indica que esta redução é baseada principalmente nas mudanças na expressão do receptor ou afinidade. Com base nessas descobertas, postulamos que as mudanças do sistema serotonérgico, mais especificamente do receptor 5-HT1A, representam um mecanismo subjacente ao efeito ansiolítico do Silexan. O potencial de ligação ao receptor da serotonina-1A mostrou ser significativamente reduzido após a ingestão de Silexan em comparação com o placebo em dois grandes aglomerados abrangendo o giro temporal, o giro fusiforme e o hipocampo por um lado, bem como a ínsula e o córtex cingulado anterior. Nenhum efeito de Silexan no volume de matéria cinzenta foi detectado nesta investigação. Assim este estudo de tomografia por emissão de pósitrons (PET) propõe um envolvimento do receptor da serotonina-1A nos efeitos ansiolíticos do Silexan.

Comentário:

Este artigo científico apresentou um mecanismo de ação para o efeito ansiolítico do Silexan (óleo essencial de Lavandula angustifolia) através de exames por imagem. O mecanismo proposto envolve o sistema neurotransmissor serotonérgico. Através da Figura 2 pode-se visualizar que a imagem referente aos voluntários após a ingestão de Silexan (2b) possui menor quantidade de áreas de coloração vermelha. De acordo com a figura, a coloração vermelha indica a ligação do receptor de serotonina-1A (5-HT1A). Já na Figura 3, visualiza-se além da imagem (3a), gráficos mostrando a redução do potencial de ligação do receptor de serotonina-1A (5-HT1A) no grupo de voluntários após a ingestão de Silexan. Em ambas as figuras, no grupo de voluntários do Silexan há menor quantidade de ligação de receptor de serotonina-1A, e por conseguinte haverá maior quantidade de serotonina livre. As Tabelas 1 e 2 apresentam os dados coletados nos exames de imagem das Figuras 2 e 3, sob a ferramenta estatística ANOVA. Desta forma este estudo nos mostra que a ação ansiolítica do óleo essencial de lavanda Lavandula angustifolia se dá através da redução de ligação do receptor de serotonina-1A (5-HT1A), deste modo provocando uma maior disponibilidade bioquímica do neurotransmissor serotonina, o qual está ligado ao mecanismo neuropsicosomático da ansiedade.

O óleo essencial de lavanda Lavandula angustifolia dentro da aromaterapia continua sendo um dos mais utilizados pela técnica de vaporização-inalação para o tratamento da ansiedade. Além de inúmeras publicações registrando a eficiência deste método de uso, outros estudos demonstraram que a inalação do óleo essencial de lavanda modifica a atividade neurológica do SNC, através de exames de ressonância magnética e de eletroencefalograma, Acreditamos que a partir do artigo comentado, novos estudos possam elucidar se a inalação do óleo essencial segue este mesmo mecanismo, para explicar a sua ação ansiolítica.

* A nova tecnologia PET/RM é o protótipo de diagnóstico por imagem híbrido e permite combinar dados moleculares obtidos da tomografia PET e informações morfofuncionais derivadas da ressonância magnética. Avanços recentes relativos a aspectos técnicos desse dispositivo, principalmente após o desenvolvimento de fotomultiplicadores de silício compatíveis com RM, permitiram uma melhora do desempenho diagnóstico da PET/RM traduzida em redução da dose e qualidade superior das imagens. … Outras indicações clínicas da PET/RM são encontradas no âmbito da neurologia, … já que envolve uma exposição baixíssima à radiação. Nossa revisão teve como objetivo destacar as indicações atuais da PET/RM e discutir os desafios e perspectivas da aplicação dessa técnica no Hospital das Clínicas da FMUSP.

Queiroz, M. A., Barbosa, F. D. G., Buchpiguel, C. A., & Cerri, G. G. (2018). Positron emission tomography/magnetic resonance imaging (PET/MRI): An update and initial experience at HC-FMUSP. Revista da Associação Médica Brasileira, 64(1), 71-84.

É um exame de imagem da medicina nuclear que utiliza radionuclídeos que emitem um positrão no momento da sua desintegração, o qual é detectado para formar as imagens do exame. Utiliza-se glicose ligada a um elemento radioativo (normalmente flúor radioativo) e injecta-se no paciente. As regiões que estão metabolizando essa glicose em excesso, tais como tumores ou regiões do cérebro em intensa actividade aparecerão em vermelho na imagem criada pelo computador. … A tomografia por emissão de positrões produz imagens mais nítidas que os demais estudos de medicina nuclear. A PET é um método de obter imagens que informam acerca do estado funcional dos órgãos e não tanto do seu estado morfológico como as técnicas da radiologia propriamente dita.

É um tipo de cintilografia. Um radionuclídeo é uma forma radioativa de um elemento, o que significa que ele é um átomo instável que se torna mais estável com a liberação de energia na forma de radiação. A maioria dos radionuclídeos libera fótons de alta energia na forma de raios gama, mas a PET utiliza radionuclídeos que liberam partículas denominadas pósitrons. Na PET, uma substância usada (metabolizada) pelo organismo, como glicose ou oxigênio, é radiomarcada com um radionuclídeo. A combinação dessa substância e do radionuclídeo é chamada marcador radioativo. O marcador se acumula em tecidos específicos do corpo. Geralmente, quanto mais ativo for o tecido (por exemplo, quanto mais glicose ou oxigênio ele utilizar), mais o marcador se acumula e mais a radiação é emitida. O aparelho de PET contém vários anéis de detectores que registram a radiação liberada. Os dados são registrados de vários ângulos diferentes. Com esses dados, os computadores produzem uma série de imagens coloridas bidimensionais que parecem fatias do corpo (chamadas tomógrafos). Os dados podem ser usados para construir imagens tridimensionais. As imagens mostram os diferentes níveis de atividade em diferentes intensidades de cores. Assim, a PET pode fornecer informações sobre o funcionamento de um tecido e pode identificar tecidos anormais, que podem ser mais ou menos ativos que os tecidos normais. Uma PET do cérebro pode mostrar quão bem o cérebro está funcionando e quais áreas do cérebro estão mais ativas durante certas atividades.