No Instituto Nacional de Câncer, práticas integrativas e complementares de saúde otimizam a saúde, a qualidade de vida e os resultados clínicos em toda a trajetória de cuidados com o câncer

Redação e Edição: Katia Machado (Fiocruz)

Revisão científica: Ricardo Ghelman e Caio Portella (CABSIN)

O trabalho desenvolvido no Instituto Nacional de Câncer do Ministério da Saúde (Inca) está pautado no conceito de oncologia integrativa, campo de cuidado centrado no paciente, baseado em evidências, para o tratamento do câncer. Carlos José Coelho de Andrade, médico oncologista do Instituto e coordenador do Núcleo de Cuidado Integral e da Unidade de Cardio-Oncologia do Hospital Pró-Cardíaco no Rio de Janeiro, conta que a oncologia integrativa se faz presente no Inca desde a década de 1980,  incluindo várias práticas integrativas listadas pela PNPIC-SUS. “No Hospital do Câncer IV, que é a unidade de cuidados paliativos do Instituto, por exemplo, são ofertadas as práticas de auriculoterapia, massagem, reiki, entre outras”, relata. 

A prática de meditação, por exemplo, foi iniciada no ano de 2017 para atender servidores do Instituto, com foco principalmente nas práticas de mindfulness (atenção plena). Esta prática, caracterizada por exercícios de respiração e consciência corporal, que ajudam as pessoas a se concentrar nas percepções do momento presente, passou também a ser oferecida a pacientes e familiares do Hospital do Câncer (HC) I e do Centro de Transplante de Medula Óssea, unidades que ficam no prédio-sede do Inca, no Rio de Janeiro, e atendem crianças, além do HC II, unidade voltada ao câncer ginecológico e do tecido ósseo e conectivo, e do HC IV, dedicado aos cuidados paliativos. 

“A intenção de iniciar a meditação com funcionários do Inca foi combater a síndrome de burnout, caracterizada por um estado de exaustão física, emocional ou mental decorrente do acúmulo de estresse no trabalho. Sabemos, com base nas evidências científicas, que a meditação promove bem-estar e qualidade de vida da pessoa que vivencia diferentes condições de saúde, especialmente o câncer, doença que carrega medos e incertezas”, justifica Andrade.

O oncologista clínico tem levado o debate científico sobre felicidade e bem-estar para o ambiente hospitalar oncológico, pois acredita que, para serem profissionais melhores, médicos precisam aprender com a trajetória dos pacientes e dos exemplos à sua volta. “Trata-se de trazer esse debate, da felicidade e promoção do bem-estar, à luz da ciência, baseada em evidências. Ou seja, como a ciência entende e compreende essa questão de felicidade e bem-estar, qual é a relação entre felicidade, bem-estar e saúde”, detalha. 

Andrade conta que a prática do mindfulness estimula pacientes de todas as idades, pais, responsáveis e funcionários a prática meditativa. “Um dia, uma mãe, após meditar por dez minutos, me disse que foi a primeira vez, em muito tempo, que não pensava em sua filha. Ao se aproximar das pessoas que estão perto da morte, a gente precisa afirmar a vida. Trazer a nossa atenção para o presente momento”, destaca, realçando mais uma vez: “A principal missão da vida é ser feliz”.

Baseado na oncologia integrativa

A instituição lança mão de práticas mente-corpo, produtos naturais e/ou modificações no estilo de vida, a partir de diferentes tradições, em conjunto com tratamentos convencionais de câncer. Segundo Andrade, a oncologia integrativa visa otimizar a saúde, a qualidade de vida e os resultados clínicos em toda a trajetória de cuidados com o câncer, além de capacitar as pessoas para prevenir o câncer e se tornarem participantes ativos antes, durante e além do tratamento do câncer.

“A oncologia integrativa é um recorte imposto por uma especialidade médica, a oncologia, que tenta olhar para a pessoa de forma integral, conforme as suas demandas”, explica. 

Ele lembra que, na oncologia, os desfechos negativos, os medos, as culpas e as incertezas são recorrentes e, por isso, faz-se necessário olhar para o paciente – e não para a doença em si -, na busca de recursos que possam melhorar aquele desfecho de saúde e a qualidade de vida da pessoa com câncer. “É, nesse contexto, que chegam outros saberes sobre a mesa para serem discutidos. A oncologia integrativa está aberta para essa discussão, de um cuidado integral, que leva em conta as demandas das pessoas”, ensina. 

Ela começa com a ausculta do paciente e busca reunir todos os recursos disponíveis, seguros e eficazes para que a pessoa possa enfrentar sua condição de saúde.

“Se a pessoa chega querendo tomar um determinado chá, usar uma erva ou medicamento, cuja interação com os fármacos via oral que ela está tomando não é conhecida, para tratar seu câncer, ao invés de refutamos de cara esse chá ou medicamento, pois trata-se de uma demanda do paciente, a gente conversa sobre isso, trazendo à tona nossas incertezas em relação a algumas questões”, exemplifica o médico.

A oncologia integrativa, em resumo, busca identificar que práticas podem somar-se ao cuidado do paciente com câncer, buscando ajudar na redução do estresse e do medo e a pessoa a aceitar sua própria natureza e os fatos como acontecem, discutindo muitas vezes as dimensões da vida e da morte. “Afinal, a morte em nossa sociedade é uma derrota. E como tratamos isso? À medida que a doença progride, que cuidados paliativos para aliviar a dor e o estresse podem ser inseridos? A oncologia integrativa não quer substituir um tratamento por outro, mas sim traz esse olhar inclusivo e integral, que acolhe as demandas dos pacientes”, concluiu Andrade. 

Segundo Ricardo Ghelman, oncopediatra e presidente do Consórcio Acadêmico Brasileiro de Saúde Integrativa (CABSIN), com a medicina convencional e as MTCI unidas sob uma estrutura coesa, a oncologia integrativa pode fornecer aos cidadãos do mundo acesso a cuidados de câncer seguros, eficazes, informados por evidências e culturalmente sensíveis. Ghelman informa que, para contribuir com este debate, o CABSIN fez a tradução para o português de um curso gratuito para pacientes e profissionais de saúde sobre o uso da fitoterapia para o cuidado oncológico. O curso, com foco na área das plantas medicinais, é uma iniciativa da Universidade de Technion de Israel e está disponível no link Traditional herbal medicine in supportive cancer care: From alternative to integrative.